As bactérias KPC ou bactérias super-resistentes a antibióticos
são um fenômeno recente observado em pacientes que viajaram ao sul da Ásia para fazerem cirurgias plásticas e retornaram a seus países. O
primeiro estudo foi publicado em 2009, na revista médica The Lancet
e se refere ao gene NDM-1, encontrado até
o momento nas bactérias Klebsiella pneumoniae e Escherichia
coli, que causam pneumonia e infecção urinária. Esse gene produz resistência
até aos antibióticos da classe das carbapenemas
e pode levar a uma preocupante pandemia em futuro próximo.
Segundo os cientistas da Universidade de Madras,
as novas bactérias chegaram à Grã-Bretanha
trazidas por pacientes que viajaram à Índia ou ao Paquistão
para realizarem tratamentos cosméticos. Ao acompanharem pacientes com sintomas
suspeitos, eles encontraram 44 casos (1,5% dos investigados) em Chennai e 26
(8%) em Haryana, na Índia. Eles também detectaram a superbactéria em Bangladesh
e no Paquistão, bem como em 37 casos na Grã-Bretanha. Os únicos antibióticos
efetivos foram a tigeciclina e a colistina.Os pesquisadores alertam que o gene se instala nos plasmídeos,
estruturas de DNA que
podem facilmente ser copiadas e transmitidas para diversos outros tipos de
bactéria. "Isso sugere uma
alarmante possibilidade de o gene se espalhar e modificar toda a população de
bactérias", disse ao Correio Braziliense Timothy Walsh,
médico descobridor do gene. A mutação
foi causada pelo uso excessivo de antibióticos e devido à falta de grandes
cuidados higiênicos nos países citados.
O gene já foi detectado também na Austrália
e em Portugal,
onde a notificação compulsória foi instituída em outubro, sempre que a
investigação de bactérias resistentes aos carbapenemos revelar a enzima NDM-1.
Até o momento, há casos relatados no Brasil, mas as
autoridades médicas afirmam que ainda não se classifica a moléstia como
Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional, classificação
definida pelo Regulamento
Sanitário Internacional (RSI 2005) para medidas contra novos agentes
infecciosos. Autoridades da Índia protestaram contra a insinuação de que o país
não é seguro para cirurgias. Por causa do turismo
médico e das viagens internacionais, e devido à baixa expectativa de novos
antibióticos, a bactéria pode se tornar grave problema de saúde pública no mundo todo.O fenômeno da resistência bacteriana é antigo e decorre de
uso indiscriminado de antibióticos e de má higienização nos hospitais. A
diferença é que desta vez a resistência chegou ao nível em que nenhum
antibiótico surte efeito contra as bactérias. Nas palavras do médico David
Livermore, da Agência Britânica para a Proteção de Saúde:
Se isto for ignorado, o
nosso receio é que a resistência se comece a propagar por outras bactérias no
Reino Unido. As bactérias que têm revelado essa resistência são as que
normalmente causam infecções urinárias, particularmente em pacientes
hospitalizados. Por vezes causam infecções em feridas e outras vezes
pneumonias, um vasto leque de infecções que afetam principalmente pessoas mais
vulneráveis, que já estejam doentes.Em outubro de 2010,
um surto da superbactéria causou a morte de 18 pessoas no Distrito Federal, dentro de um universo
de 183 contaminados. Entretanto, não é o mesmo micro-organismo da Ásia, apenas
possui a mesma origem no gene mutante da Klebsiella pneumoniae. As autoridades
médicas posteriormente reconheceram casos em Paraíba, Espírito Santo, Rio
de Janeiro, São Paulo, Rio
Grande do Sul e Paraná. Anunciaram também uma reunião da Anvisa para
restringir a venda de antibióticos no Brasil e discutir outros meios de evitar
a propagação da superbactéria.
O surto de superbactéria no Distrito Federal foi causado sobretudo pela má
higiene hospitalar e pela falta de recursos materiais, enfatizando a
necessidade de mais verbas para o SUS e a conscientização de médicos e pacientes contra o uso
indiscriminado de antibióticos, o que causa seleção bacteriana. Entretanto, o problema ainda
se restringe a ambientes hospitalares. O infectologista
Alexandre Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia do Distrito
Federal, explica o problema da seguinte forma:
quem corre mais risco de infecção
são pacientes que estão com sonda, catéter, punção venosa ou em outra situação
que possa favorecer a infecção bacteriana. Mas, para quem visita o paciente, o
risco é de ser colonizado pela bactéria, algo muito diferente de ser
contaminado. Ou seja, a bactéria pode estar presente nas mãos, nos braços e no
trato digestivo do visitante que manteve contato com o paciente, mas ele só
correrá o risco de contaminação se sua saúde estiver debilitada e ele estiver
com a imunidade baixa. Segundo o médico David Uip, diretor do Instituto Emílio Ribas,
unidade de referênia em infectologia no Brasil, o custo de desenvolvimento de
novos antibióticos é muito elevado e os laboratórios
farmacêuticos podem não se interessar, exigindo-se portanto pesados investimentos
públicos. Ele afirnou que os infectologistas brasileiros estão se valendo da polimixina
para enfrentarem as supebactérias, mas isso poderá causar nova seleção bacteriana. A Sociedade Americana de
Doenças Infecciosas estabeleceu como meta, até 2020, colocar dez novos
produtos no mercado.
Em 2011, uma cepa
de Staphylococcus aureus também foi
identificada como uma bactéria resistente a todos os antibióticos. A amostra
foi colhida no leite de vaca na Escócia, Inglaterra, Dinamarca, Irlanda e
Alemanha, mas o mesmo germe se encontra em seres humanos, principalmente na
pele. Geralmente o estafilococo só causa doença quando a pessoa se corta e essa
variedade não é mais patogênica, mas resiste a qualquer antibiótico, tornando
mais difícil o tratamento. Isso se deve a um gene chamado CFR, que codifica uma proteína capaz de
proteger o ribossomo
da bactéria contra o antibiótico. Entretanto, pode haver uma alternativa. O Hospital das Clínicas de São Paulo
investigou o efeito do ozônio em dez bactérias,
incluindo a KPC, e concluiu que essa substância pode destrui-las por meio de
corrosão de suas membranas. O teste foi feito in vitro, com colônias de bactérias, e deve ser repetido em
pacientes de hospitais e UTIs,
cujos ambientes podem ser vaporizados com ozônio. Esse gás há tempo vem sendo
usado com sucesso em infecções bacterianas.
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